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Reproduzindo a norma prevista na Lei nº 8.666/1993, a Lei nº 14.133/2021 também previu o leilão como “modalidade de licitação para alienação de bens imóveis ou bens móveis inservíveis ou legalmente apreendidos a quem oferecer o maior lance” (artigo 6º, XL).
O critério de julgamento das propostas adotado no leilão é, segundo dispõe o artigo 33, V, da nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos o de maior lance, o que torna o procedimento menos complexo, inclusive porque não se exige, para o leilão, registro cadastral prévio, não contemplando, por igual, a fase de habilitação. Logo, na modalidade leilão, a homologação ocorre assim que concluída a fase de lances, quando superada a fase recursal e efetivado o pagamento pelo licitante vencedor, na forma definida no edital (§4º do artigo 36 da Lei nº 14.133/2021).
O leilão não admite a apresentação de propostas escritas, eis que prioriza a proposta verbal, realizando a venda por meio de lances sucessivos e crescentes. Dito de outro modo, se a proposta, por alguma razão, deva ser apresentada escrita, a modalidade devida é a concorrência. Isso porque a apresentação de propostas por escrito, em envelopes fechados, é incompatível com o leilão, uma vez que sua particularidade reside, justamente, na possibilidade de lances sucessivos e verbais.
Um dos pontos mais importantes da nova Lei Geral de Licitações e Contratos Administrativos é que o leilão passa a ser modalidade de licitação que se presta para a alienação de qualquer bem da Administração Pública, seja ele móvel ou imóvel, conforme disciplinado no artigo 76.
Juliano Heinen [1] chama a atenção para o fato o leilão como típico critério que deve estar coligado a contratos que visem a adquirir maior renda para o poder público. “Aqui, a baliza da seleção da melhor proposta se dá por critério monetário (valor). Por isso, é muito comum ser utilizada a modalidade de leilão para alienar determinado objeto, ou seja, conseguir um maior valor por ele”.
O §2º do artigo 31 prevê a publicização do edital do leilão, que deve ocorrer em sítio eletrônico oficial, contendo: “I – a descrição do bem, com suas características, e, no caso de imóvel, sua situação e suas divisas, com remissão à matrícula e aos registros; II – o valor pelo qual o bem foi avaliado, o preço mínimo pelo qual poderá ser alienado, as condições de pagamento e, se for o caso, a comissão do leiloeiro designado; III – a indicação do lugar onde estiverem os móveis, os veículos e os semoventes; IV – o sítio da internet e o período em que ocorrerá o leilão, salvo se excepcionalmente for realizado sob a forma presencial por comprovada inviabilidade técnica ou desvantagem para a Administração, hipótese em que serão indicados o local, o dia e a hora de sua realização; V – a especificação de eventuais ônus, gravames ou pendências existentes sobre os bens a serem leiloados”.
Ainda no que tange à publicização, o §3º do artigo 31 prevê regra que, aparentemente, ocasionaria nulidade em caso de seu descumprimento, porquanto vaticina, imperativamente, que “além da divulgação no sítio eletrônico oficial, o edital do leilão será afixado em local de ampla circulação de pessoas na sede da Administração e poderá, ainda, ser divulgado por outros meios necessários para ampliar a publicidade e a competitividade da licitação”.
Em tempos de pandemia, em que as repartições públicas se encontram fechadas, opinamos no sentido de que o descumprimento de tal regra, sobretudo na parte inicial (afixação do edital em local de ampla circulação de pessoas na sede da Administração), não acarreta imediata nulidade, à medida que, sendo o objetivo principal a máxima publicidade, se esta é atingida por meio de divulgação em outros meios, não se pode inquinar de nulo um leilão cujo edital não tenha sido afixado na sede da Administração. Por outro lado, entendemos que essa regra vai de encontro ao princípio da virtualização, previsto no artigo 5º da lei.
Corroborando nosso entendimento, Marçal Justen Filho destaca que “a solução pressupõe a existência de via física, destinada a levar a realização do leilão ao conhecimento do maior número de pessoas. A eficácia dessa solução é duvidosa e a previsão legal pode ser interpretada como um resquício de regras pretéritas, adotadas em contexto não mais existente” [2].
O ponto mais inquietante do leilão diz respeito à figura do leiloeiro, se oficial ou agente da Administração. É o que dispõe o §1º do artigo 31, segundo o qual: “Se optar pela realização de leilão por intermédio de leiloeiro oficial, a Administração deverá selecioná-lo mediante credenciamento ou licitação na modalidade pregão e adotar o critério de julgamento de maior desconto para as comissões a serem cobradas, utilizados como parâmetro máximo os percentuais definidos na lei que regula a referida profissão e observados os valores dos bens a serem leiloados”.
A profissão de leiloeiro se encontra disciplinada no Decreto-Lei nº 21.891/1932. Ocorre que existe uma pluralidade de leiloeiros matriculados perante a junta comercial, sendo assegurada a autonomia dos interessados na escolha daquele que prestará os serviços, razão pela qual a Administração Pública selecionará o leiloeiro por meio de credenciamento (conforme dispõe o artigo 79 da Lei nº 14.133/2021) ou por meio de licitação na modalidade pregão.
Como o caput do artigo 31 faculta à Administração optar pela realização do leilão por meio de leiloeiro oficial ou por servidor designado, a questão sobre a remuneração do sujeito que conduz o leilão resta problemática. Não há qualquer margem de dúvidas no sentido de que, em se tratando de leiloeiro oficial, a remuneração, que ficará ao encargo do arrematante, é definida desde o momento do credenciamento ou da licitação, na modalidade pregão, para sua escolha, sendo o critério adotado o maior desconto para as comissões a serem cobradas.
Se o leilão vier a ser frustrado, não caberá ao leiloeiro qualquer comissão, à míngua de qualquer importância que possa ser cobrada. É imprescindível, contudo, que o edital do leilão preveja a impossibilidade de qualquer remuneração ao leiloeiro no caso de não haver licitantes interessados. Logo, mesmo havendo um pregoeiro que haja se sagrado vencedor do pregão destinado à sua escolha, nada há que se falar em remuneração do leiloeiro se, no leilão, não aparecerem licitantes interessados. Trata-se de risco a ser avaliado pelo leiloeiro desde a fase de credenciamento ou quando da participação do pregão.
Ainda no que tange à remuneração, considerando que o leilão prevê a possibilidade de remuneração para o leiloeiro a encargo do licitante vencedor, não visualizamos qualquer obstáculo quanto à remuneração do servidor público designado pela Administração para exercer tal função. Renato Geraldo Mendes, comentando a Lei nº 8.666/1993, destaca que “qualquer vantagem pecuniária a servidor designado pela Administração como leiloeiro administrativo dependerá de lei a ser editada pela própria esfera governamental interessada (…)” [3].
Discordamos, parcialmente, do posicionamento de Renato Geraldo Mendes, entendendo que a previsão no edital é suficiente para suprir a ausência de lei ou, por outro lado, que o ato de designação pela autoridade competente pode prever algum critério de remuneração, como forma de estimular a participação integrativa dos agentes administrativos no processo de alienação dos bens públicos.
Por fim, insta salientar que o leilão, embora não corriqueiro na atividade administrativa, quando comparado, por exemplo, com outras modalidades de licitação, como pregão ou concorrência, pode encontrar amplo espaço em Administrações Públicas que priorizem a formação de receitas originárias.
Exemplificativamente, em havendo um plano de governo que vise à desestatização, o leilão se tornará uma das modalidades mais usuais para a Administração Pública, sendo necessário, nesse caso, desenvolver, paralelamente à política econômica de privatização da máquina administrativa, a formação de leiloeiros entre os agentes administrativos integrantes dos quadros administrativos, por meio de cursos de formação e estímulo ao desempenho da função, invariavelmente por meio do apoio financeiro.
[1] HEINEN, Juliano. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 2ª ed. Salvador: JusPODIVM. 2022, p. 234.
[2] JUSTEN FILHO. Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2021, p. 452.
[3] MENDES, Renato Geraldo. Lei de licitações e contratos anotada. 9ª ed. Curitiba: Zênite. 2011, p. 1.054.