TERMO DE COOPERAÇÃO DE GESTÃO ASSOCIADA DO HOTEL ESCOLA BOSQUE NO ARQUIPÉLAGO DO BAILIQUE

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Parecer 718/2011 NCA-PGE/AP

Processo nº 51.000.012/2008

CONVÊNIO ADMINISTRATIVO (TERMO DE COOPERAÇÃO DE GESTÃO ASSOCIADA). DESCUMPRIMENTO DAS CLÁUSULAS DO CONVÊNIO. POSSIBILIDADE DE RESCISÃO. NECESSIDADE     DE     REALIZAÇÃO     DE     PROCEDIMENTO     LICITATÓRIO     –     MODALIDADE CONCORRÊNCIA. CONCESSÃO DE USO DE BEM PÚBLICO.

 

 

 

Trata-se de convênio firmado entre o Estado do Amapá, de um lado, e a Cooperativa de Negócios e Consultoria Turística (CONECTUR), de outro, para gestão associada do Hotel Escola Bosque do Arquipélago do Bailique.

 

 

 

A  Secretária  de  Estado  do  Turismo  consulta  esta  Procuradoria  sobre  a  condição  de  legalidade  e permanência do convênio firmado entre o Estado, por meio de sua Secretaria de Turismo, e a Cooperativa.

 

 

 

QUESITOS

 

 

 

  1. Qual a natureza jurídica dos convênios? O que os diferencia dos contratos administrativos?

 

 

 

  1. Havendo a possibilidade de concorrência, é possível firmar convênio com entidade particular sem fim lucrativo ou é necessário procedimento licitatório?

 

 

 

  1. O não cumprimento dos termos do convênio pela convenente importa em sua rescisão de pleno direito?

utilização do bem público?

 

 

 

Repousa sobre tais questionamentos o discorrer fático-jurídico a que se ocupará de responder no presente

dictamen.

 

 

 

PRELÚDIO FÁTICO

 

 

 

Em 10.01.2008, o representante legal da Cooperativa de Negócios e Consultoria Turística (CONECTUR), convenente, enviou solicitação1 de interesse na exploração do Hotel Escola Bosque do Arquipélago do Bailique, seguindo anexo projeto2 para análise e apreciação pelo setor competente da Secretaria.

 

 

No referido projeto, consta introdução, descrição da estrutura física do Hotel Escola, diagnóstico da situação atual do Hotel Escola, gestão do Hotel Escola, objetivos, meta, justificativa, concepção do projeto, projeto pedagógico, metodologia, custo total do projeto, possíveis parcerias.

 

 

 

Junto a tal solicitação, veio também o estatuto da CONECTUR e demais documentos relativos à Cooperativa, como certidões negativas, ata de assembleia geral, entre outros.

 

 

Às fls. 56-60, há parecer técnico3 do Departamento de Desenvolvimento de Turismo do Estado, Divisão de Operacionalização de Projetos Especiais, entendendo, sinteticamente, pela possibilidade de firmação do termo de cooperação.

 

 

 

Das fls. 83-92, há a minuta do convênio com referidos anexos. Ato contínuo, houve a emissão de manifestação jurídica4 da Assessoria Jurídica da Secretaria (fls. 93-96) opinando favoravelmente pela celebração do convênio.

 

 

 

Fora emitido, ainda, parecer jurídico5 pela Procuradoria-Geral do Estado, com opinião favorável pela celebração do convênio, não obstante as ressalvas feitas, destacando-se: (a) comprovação efetiva de que a convenente (CONECTUR) é instituição cooperativa sem fim lucrativo; (b) inexistência de qualquer outro interessado na gestão do Hotel Escola Bosque; (c) assunção de compromissos pela CONECTUR no desembolso de valores para reforma/reparo do Hotel; (d) comprovação efetiva de firmamento de parcerias com outros órgãos que possam, efetivamente, auxiliar na revitalização do Hotel; (e) assunção incondicional de qualquer efeito de natureza trabalhista e cível, em caso de reclamação de pessoal ou vítima, em decorrência da exploração do uso

do bem pela CONECTUR.

 

 

 

Houve o acolhimento parcial,  pelo Procurador-Geral do Estado à época, do retromencionado parecer jurídico, excluindo, apenas, a exigência contida na alínea “d”.

 

 

Às fls. 110-112, consta outra manifestação6 da Assessoria Jurídica da Secretaria de Estado, mencionando a natureza não lucrativa da convenente – CONECTUR – e opinando pelo prosseguimento do processo para formalização do convênio em pauta.

 

 

 

Logo após, houve parecer técnico do Departamento de Planejamento do Turismo (DPT), da Secretaria de Estado do Turismo, concluindo que o plano de trabalho deveria, apenas, ser alterado em suas datas, tendo em vista encontrar-se adequado ao objeto do convênio, recomendando, ainda, que fossem realizados os procedimentos necessários à assinatura dos documentos, convênios e protocolos no prazo mais rápido, de modo

a interromper a deterioração do patrimônio.

(concedente), pelo presidente da CONECTUR (convenente) e pela Secretária de Turismo do Estado (interveniente/concedente), com a aposição de duas testemunhas. Continuamente, nas fls. 139-140, há o Termo Provisório de Entrega de Bens Públicos (imóvel e mobiliários) ao convenente, documento datado do dia 16.04.2008.  O  convênio  foi  devidamente  publicado  no  Diário  Oficial  do  Estado  nº  4300,  que  circulou  em

30.07.2008.

 

 

 

Em 20.04.2009, a Chefe da Unidade de Convênios e Contratos da Secretaria de Turismo do Estado informou7 à Secretária de Estado ter recebido o 1º Relatório de Execução do convênio estadual sob análise (fls. 145-150), solicitando, ainda, o encaminhamento do processo para a área técnica, para que fosse emitido parecer,

tendo como parâmetro o plano de trabalho, a visita in loco e outros documentos necessários para a comprovação das atividades realizadas no bem público objeto do convênio.

 

 

Posteriormente, dois anos após o último ato juntado ao processo, ocorreu, por parte da atual Secretária de Turismo do Estado (fls. 151), encaminhamento dos autos à Assessoria Jurídica da Secretaria, solicitando emissão de parecer sobre a permanência do termo de cooperação associada.

 

 

 

Mais uma vez, a Assessoria Jurídica da Secretaria de Turismo do Estado emitiu manifestação jurídica, opinando, apertadamente, pela rescisão contratual do convênio em apreço e determinando que fosse expedida carta registrada para a convenente (CONECTUR) dando prazo de 60 dias para a desocupação do imóvel e, ainda,

que fosse deflagrado processo administrativo licitatório.

 

 

 

Por determinação da regra inserta no art. 2º do Decreto estadual nº 3.999/10, vieram, então, os autos a esta Procuradoria, para emissão de parecer jurídico. Era o que cumpria, laconicamente, relatar.

 

 

 

FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA

 

 

 

    • A figura do convênio

 

 

 

Como dito, a fundamentação para o presente caso reside, primeiramente, em saber a natureza jurídica dos convênios, figura que se amolda de forma diversa dos contratos e que encontra, na doutrina e na jurisprudência, conceituação polêmica.

 

 

 

A diferenciação faz-se pertinente ao caso, uma vez que a proposta da consulta formulada consiste, justamente, em saber se se trata de objeto para o qual a realização de licitação é imprescindível. “A distinção é sumamente importante, porquanto o convênio não tem como antecedente necessário o procedimento licitatório”.8 Em princípio, “não é necessária a realização de licitação para celebração de convênios”.9

 

 

Para Edmir Netto de Araújo,

 

 

 

convênios são convenções, mas não contratos, pois nestes as vontades são antagônicas, se compõem, mas não se adicionam, delas resultando uma terceira espécie (vontade contratual, resultante e não soma), ao passo que nos convênios, como nos consórcios, as vontades se somam, atuam paralelamente, para alcançar interesses e objetivos

comuns.

 

 

 

São, portanto, acordos de cooperação (quando todas as pessoas têm atividades preordenadas para o fim desejado) ou de colaboração (quando as pessoas desempenham atividades-meio, preparatórias, auxiliares ou complementares da atividade estatal, para o objetivo comum), e por essa razão a posição jurídica dos signatários é uma só, idêntica para todos, podendo haver, apenas, diversificação na cooperação de cada um, segundo as suas possibilidades, para consecução do objetivo comum, desejado por todos, do que decorre: ausência de vinculação contratual, a inadmissibilidade de cláusula de permanência obrigatória (os convenentes podem denunciá-los antes do término do prazo de vigência, promovendo o respectivo acerto de contas) e de sanções pela inadimplência. 10

O Tribunal de Contas da União explica didaticamente referida diferenciação entre convênios e contratos em voto do Ministro Mário Pacini, in verbis:

 

 

Grosso modo, pode-se dizer que a distinção mais precisa entre o contrato e o convênio é quanto à reciprocidade de obrigações (bilateralidade). Enquanto no contrato uma das partes de obriga a dar, fazer ou não fazer alguma coisa, mediante pagamento previamente acertado (caso mais comum nos contratos de compra e venda, para não nos alongarmos na extensa doutrina dos contratos), no Convênio os interesses são comuns e a contraprestação em dinheiro não precisa existir. O que se faz é ajuste de mútua colaboração para atingimento de objetivo comum. (TCU,

TC-001.582-5, DOU de 18.09.1985.)

 

 

 

Os convênios podem ser celebrados entre órgãos de uma mesma pessoa jurídica ou por pessoas jurídicas distintas, e, nesse último caso, a sua execução e a sua operacionalidade fincam-se na confiança recíproca e na cooperação.

 

 

 

Para Marçal Justen Filho,

 

 

 

convênio é o instrumento de realização de um determinado e específico objetivo, em que os interesses não se contrapõem – ainda que haja prestações específicas e individualizadas, a cargo de cada partícipe. No convênio, a assunção de deveres destina-se a regular atividade harmônica de sujeitos integrantes da Administração Pública, que buscam a realização imediata de um mesmo e idêntico interesse público. 11

 

 

A celebração dos convênios, por sua natureza, independe de licitação prévia. A Constituição vigente, embora não se referindo expressamente aos convênios no conjunto de regras que tratam da partilha de competências, deixa implícita a possibilidade de serem ajustados, o que se deduz por meio da leitura do art. 23, parágrafo único, com a redação dada pela EC nº 53/06: “leis complementares fixarão normas para a cooperação entre a União e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e

do bem-estar em âmbito nacional”.

 

 

 

Um ponto interessante merece ser destacado: a questão da entidade de apoio, a qual, segundo Maria Sylvia Di Pietro,12 é pessoa jurídica de direito privado sem fins lucrativos, em regra, associação ou fundação, que presta serviços sociais não exclusivos do Estado, mantendo vínculo com entidade da Administração direta ou indireta por

meio de convênio. No presente caso, por se tratar de acordo de cooperação, torna-se inócua a existência da entidade de apoio.

 

 

 

    • Da análise do caso concreto

 

 

 

O art. 116 da Lei de Licitações e Contratos salienta quais são os requisitos mínimos para que seja realizado um convênio. Furta-se à análise de tal dispositivo legal, uma vez que desnecessário para o presente caso. Por isso,  importa  mencionar,  acima  de  tudo,  as  exigências  previstas  na  Lei  nº  8.666/93  no  que  concerne  à

obrigatoriedade de realização de procedimento licitatório.

 

 

 

Licitar não é faculdade da Administração, mas dever, mister constitucionalmente delineado pelo legislador constituinte originário que norteia a atividade administrativa e garante a preservação do interesse público, visando, principalmente, à escolha da proposta mais vantajosa para o Poder Público. Bandeira de Mello acentua:

 

 

 

sendo encarregada de gerir interesses de toda a coletividade, a Administração não tem sobre estes bens disponibilidade que lhe confira o direito de tratar desigualmente àqueles cujos interesses representa. Não sendo o interesse público algo sobre que a Administração dispõe a seu talante, mas, pelo contrário, bem de todos e de cada um, já assim consagrado pelos mandamentos legais que o erigiram à categoria de interesse desta classe, impõe-se, como conseqüência, o tratamento impessoal, igualitário ou isonômico, que deve o Poder Público dispensar a todos os administrados. 13

 

 

Na realidade, o dever de licitar traduz-se não apenas como múnus para o Estado, mas, principalmente,

como verdadeira política pública.

 

 

 

É impossível compreender-se estado democrático de direito operante sem políticas públicas pré-definidas e funções administrativas sem o balizamento de normas jurídicas. A atividade contratual da Administração Pública,  mesmo quando  no  exercício  de  competências  discricionárias,  deve  exprimir  escolhas  ditadas  por  políticas  públicas  e

implementadas de acordo com as normas jurídicas que viabilizem a concretização do interesse público.

 

 

 

A norma constitucional que estabelece o dever de licitar traduz política pública na medida em que pressupõe ser a competição seletiva isonômica aquela que habilita a Administração Pública, consultado o mercado, à identificação  da  proposta  mais  favorável  à  prestação  de  serviços,  à  execução  de  obras,  à  compra  ou  à

alienação de bens . A competição reduz o risco de formação de cartéis e superiormente atende aos princípios nomeados na cabeça do art. 37 da CR/88. 14 (Grifamos.)

 

 

O Supremo Tribunal Federal oportunizou o debate sobre o tema, em voto da lavra da Ministra Carmen Lúcia, enaltecendo o princípio da obrigatoriedade do procedimento licitatório:

 

 

A licitação é um procedimento que visa à satisfação do interesse público, pautando-se pelo princípio da isonomia. Está voltada a um duplo objetivo: o de proporcionar à administração a possibilidade de realizar o negócio mais vantajoso – o melhor negócio – e o de assegurar aos administrados a oportunidade de concorrerem, em igualdade de condições, à contratação pretendida pela administração. (…) Procedimento que visa à satisfação do interesse público, pautando-se pelo princípio da isonomia, a função da licitação é a de viabilizar, através da mais ampla disputa, envolvendo o maior número possível de agentes econômicos capacitados, a satisfação do interesse público. A competição visada pela licitação, a instrumentar a seleção da proposta mais vantajosa para a administração, impõe-se seja desenrolada de modo  que  reste  assegurada  a  igualdade  (isonomia)  de  todos  quantos  pretendam  acesso  às  contratações  da

administração (…). (STF, RE nº 607.126-AgR, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 02.12.2010, DJ de 1º.02.2011.)

 

 

 

Ora, por várias vezes, no curso do processo, verificou-se, principalmente quando da emissão do primeiro parecer jurídico da Procuradoria-Geral do Estado, a necessidade de demonstração de outros interessados no objeto do convênio. E como se comprova tal desinteresse? Por meio de procedimento licitatório.

 

 

 

É que a figura aqui tratada, transmudada pelo rótulo de convênio, converte-se, na verdade, sob as especificidades de contrato administrativo, cujas bilateralidade e comutatividade ecoam com mais veemência.

 

 

Por várias razões, adiante assinaladas, percebeu-se a impossibilidade de firmar convênio no caso em tela. A principal dessas razões reside, precisamente, na possibilidade de competição, ferindo o princípio da obediência ao procedimento licitatório.

 

 

 

Com efeito, não consta nos autos nenhuma justificativa de que a cooperativa convenente era a única e exclusiva interessada pela exploração do Hotel. Se tão vantajosa é a exploração turística do local, como faz crer as justificativas, a amplitude concorrencial somente seria aferível por meio de prévio procedimento licitatório, o que

de fato não ocorreu.

 

 

 

Todavia, a situação encontra-se posta, e, sobre esta, deve o Estado, por meio deste Núcleo Consultivo, oferecer uma resposta.

 

 

 

    • A solução possível e adequada

 

 

 

A opinião do parecerista quanto à viabilidade econômica do empreendimento é inócua, eis que a consulta se refere a aspectos jurídicos. Resta saber, então, se houve afronta ao princípio da obrigatoriedade de observação de licitação. De antemão, já se antecipou: acredita-se que sim.

A Constituição Federal regula a matéria em seu art. 175, o qual foi regulamentado pela Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995.

 

 

Utilizando seu poder de auto-organização, o Estado do Amapá previu a matéria. O art. 189 da Constituição Estadual vaticina que, ao Estado, incumbe a prestação de serviços públicos de sua competência. O § 1º do referido artigo salienta que a execução poderá ser delegada, precedida de licitação, nos regimes de concessão ou

permissão.

 

 

 

Regulamentando esse artigo da Constituição Estadual, a Lei nº 916, de 18 de agosto de 2005, dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos no Estado.

 

 

 

Os arts. 3º e 15 da Lei são enfáticos ao afirmar que:

 

 

 

Art. 3º As concessões de serviço público e as concessões de obras públicas serão sempre precedidas de licitação, na modalidade de concorrência pública.

 

 

 

Art. 15 Toda concessão ou permissão de serviço público, precedida ou não de execução de obra pública, será objeto de prévia licitação, nos termos da legislação própria e com observância dos princípios da legalidade, moralidade, publicidade, igualdade, do julgamento por critérios objetivos e da vinculação ao instrumento convocatório. 15

 

 

Portanto, trata-se de concessão de uso de bem público, entendida como “o contrato administrativo pelo qual, como o nome já indica, a Administração trespassa a alguém o uso de um bem público para uma finalidade específica”.16

 

 

O primeiro e imprescindível requisito para promover a concessão de determinado serviço público (existência de lei) encontra-se, desse modo, atendido, forte na legislação estadual retromencionada.

 

 

Para manter a igualdade de participação entre os possíveis interessados, deve ser promovido, como aludido, o competente procedimento licitatório, e a concorrência é a modalidade licitatória para a concessão de uso de bens públicos, o que se deduz, também, de acordo com a regra inserta no art. 45, § 1º, da LNL.

 

 

 

Podem ser objeto de concessão de uso os bens públicos em geral, de acordo com a destinação específica, legal ou contratual, que a eles é dada, devendo estar essa destinação explicitada no contrato de concessão, nas cláusulas que tratam do objeto, finalidades e condições do uso concedido.17

 

 

É de bom alvitre salientar que o bem objeto do futuro contrato de concessão se classifica, de acordo com a categorização adotada pela doutrina em geral, como de uso especial, assim entendidos:

 

 

os afetados a um serviço ou estabelecimento público, como as repartições públicas, isto é, locais onde se realiza atividade pública ou onde está à disposição dos administrados um serviço público, como teatros, universidades, museus e outros abertos à visitação pública. 18

 

 

Diante do estado em que se encontram os bens mobiliários e o próprio imóvel – Hotel Escola Bosque Arquipélago do Bailique –, pode-se questionar, inclusive, a desafetação do bem, uma vez que, segundo relatório, não tem sido utilizado para sua finalidade precípua: exploração de atividade turística.

 

 

 

Inquestionavelmente, pelo desuso do bem no seu desígnio principal, há a iminência de desafetação, a qual, em regra, deve acontecer por autorização legislativa, muito embora a doutrina 19 entenda que, por acontecimentos outros, o bem público, de uso especial, também possa ser desafetado. Portanto, para que se mantenha a

finalidade para o qual foi constituído, deve ser feito o contrato administrativo de concessão de uso de bem público.

 

 

 

    • Quanto à rescisão do Convênio 1/2008

 

 

 

Pelo observado do inventário de bens juntado ao processo, realizado por intermédio de Comissão Responsável para Realizar o Levantamento Patrimonial dos Bens Móveis e Imóveis da Secretaria de Estado do Turismo, a convenente – CONECTUR – abandonou o projeto e deixou de cumprir com as cláusulas do contrato, não mantendo os bens nas mesmas condições de conservação e limpeza. Afora isso, não apresentou, no final do primeiro trimestre do ano, o relatório anual das atividades/metas alcançadas do ano

anterior.

 

 

 

A Cláusula Quinta do Convênio nº 1/2008 estabelece:

 

 

 

o presente convênio terá vigência de 10 (dez) anos, a partir do dia da data de assinatura, podendo ser prorrogado, alterado ou complementado, por acordo entre as partes, mediante assinatura de Termo Aditivo.

 

 

 

Por outro lado, o parágrafo único da mesma Cláusula ressalva:

 

 

 

a vigência do convênio estará condicionada à apresentação do relatório de atividades/metas alcançadas pelo convenente que deverá ser entregue, impreterivelmente, no final do primeiro trimestre de cada ano.

 

 

 

Ao que já pôde ser observado, trata-se, em verdade, de instrumento jurídico com feições mais apropriadas aos contratos. A Cláusula Oitava do referido Convênio menciona a possibilidade de rescisão e alteração, esta podendo ser feita por termos aditivos. Todavia, vaticina que a rescisão deverá ser de comum acordo entre as partes, a qualquer tempo, por inadimplência total ou parcial de quaisquer das obrigações ou condições pactuadas, desde que, para tanto, haja comunicação de uma parte à outra, mediante carta registrada, com antecedência

mínima de 60 dias.

 

 

 

Ocorre que, não obstante a Cláusula Oitava prever a rescisão do contrato, a Cláusula Sétima também menciona, sob a rotulação “reversão”, a total nulidade do termo, independentemente de ato especial, nos casos, entre  outros,  em  que  houver  inobservância  da  apresentação  do  relatório  de  atividades  e  metas  e  por

inadimplemento de cláusula do convênio.

 

 

 

Por força da regra posta no caput do art. 116 da Lei nº 8.666/93, segundo a qual são aplicáveis aos convênios as suas disposições, é possível evidenciar as hipóteses de rescisão contratual.

 

 

Há vários motivos, dantes referidos, que ensejam a rescisão contratual.20Importa, acima de tudo, que, antes de rescindir o convênio, seja oportunizada à convenente a defesa prévia, em atendimento aos princípios constitucionais do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal.

 

 

 

Na medida em que a ampla defesa não pode ser considerada como simples garantia formal, mas como participação efetiva do interessado no aclaramento e formação da decisão, faz-se necessário o pleno conhecimento das razões dos atos administrativos e processuais, pois somente assim se poderá construir uma orientação ou conclusão válida a respeito deles. 21

 

 

O Superior Tribunal de Justiça também manifestou-se favoravelmente sobre o tema, entendendo pela obediência ao devido processo legal, quando do julgamento do recurso em Mandado de Segurança nº 16.761, DJ de 06.03.2006.

Dessa feita, para proceder à rescisão, necessária se faz a comunicação da convenente para, caso queira, manifestar-se sobre aludida rescisão.

 

 

 

CONCLUSÃO

 

 

 

Diante do exposto, esta Procuradoria, em análise restrita à documentação juntada ao processo, opina pela rescisão do Convênio nº 1/2008, oportunizando, todavia, à parte convenente – CONECTUR – o direito à defesa prévia, em que lhe seja garantido o contraditório, o que, em obediência à Cláusula Oitava do convênio, deve ser

feito por meio de expedição de carta registrada, com antecedência mínima de 60 dias.

 

 

 

É necessária a apuração da responsabilidade do agente público que não fiscalizou o cumprimento do convênio, importando, assim, se constatada a existência de danos, em possível reparação.

 

 

Ultimados tais atos, deve-se deflagrar procedimento licitatório, sob a modalidade concorrência, para a concessão de uso de bem público, em consonância ao disposto no art. 189 da Constituição Estadual e à Lei nº 916/05 (arts. 3º e 15).

 

 

 

Escusando-se de haver ultrapassado o pedido meramente jurídico que a consulta requeria, é o que parece.

 

 

 

Remeto às considerações superiores.

 

 

 

Macapá, 19 de julho de 2011.

 

 

 

 

1 Ofício nº 1/2008.

 

  1. Gestão do Hotel Escola Bosque. Utilização da biodiversidade, serviços da comunidade e infraestrutura existente no distrito do Bailique para a implantação do Programa do Turismo Solidário.

 

 

  1. Parecer Técnico nº 1 – DDT-DOPE-SETUR, de 28 de janeiro de 2008.

 

 

  1. Parecer nº 8/2008 – ASSEJUR/SETUR.

 

 

  1. Parecer jurídico nº 135/2008 – PGE.

 

 

  1. Manifestação nº 5/2008 – ASSEJUR/SETUR.

 

 

  1. Memorando nº 13/2009-UCC/SETUR.

 

 

  1. MOTTA, Carlos Pinto Coelho. Eficácia nas licitações e contratos. 12. ed. Belo Horizonte: Del Rey, p. 827.

 

 

  1. SOUTO, Marcos Juruena Villela. Direito administrativo das concessões: concessões, terceirizações, convênios, consórcios, acordos e outras formas de gestão associada. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004. p. 439.
  2. ARAÚJO, Edmir Netto. Curso de direito administrativo. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 729.

 

 

  1. JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 7. ed. São Paulo: Dialética, 2008. p. 668.

 

 

 

  1. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Curso de direito administrativo. 21. ed. São Paulo: Atlas.

 

 

  1. BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 73.

 

 

  1. PEREIRA JUNIOR, Jessé Torres; DOTTI, Marinês Restalatto. Políticas públicas nas licitações e contratações administrativas. Belo Horizonte: Fórum, 2009. p. 31.

 

 

  1. Disponível em: <http://www.al.ap.gov.br/pagina.php?pg=buscar_legislacao&tipo=lo&situacao=aprovado>. Acesso em: 13 jul. 2011.

 

 

  1. BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Op. cit., 2009. p. 920.

 

 

  1. ARAÚJO, Edmir Netto. Op. cit., p. 743.

 

 

  1. BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Op. cit., 2009. p. 904.

 

 

  1. Nesse sentido, Ibid., p. 905.

 

 

  1. Utiliza-se o termo “contratual”, porque, embora se trate de convênio, este pode se abeberar das regras peculiares aos contratos (art. 116, caput, Lei nº 8.666/93).

 

 

  1. MOTTA, Carlos Pinto Coelho. Op. cit., p. 614.

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