O QUE FAZER COM A PACTA SUNT SERVANDA?

Baixe o arquivo em pdf clicando aqui

Com a devida vênia, a decisão do STJ feriu enormemente a autonomia da vontade das partes contratantes, pondo por terra a liberdade de contratar, inquietando a classe advocatícia com temores de insegurança jurídica. E o que é mais grave: aniquilou a autonomia da Ordem, a qual tem por escopo zelar pela fiscalização de seus profissionais, inclusive com procedimentos próprios, a exemplo do processo ético-disciplinar.”

Surpreendeu-me, com profunda tristeza, o julgamento proferido pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça nos autos do REsp nº 1.155.200-DF, Rel. Min. Massami Uyeda, DJe 02.03.11, cujo acórdão foi relatado pela Ministra Nancy Andrighi, que deu provimento ao recurso especial, para revisar o patamar dos honorários advocatícios contratuais, firmados inicialmente em 50% (cinquenta por cento), fixando-os em 30% (trinta por cento) sobre a condenação total obtida.

Resumidamente, trata-se de demanda na qual a cliente recebeu do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) a quantia aproximada de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais), tendo os advogados que atuaram no processo auferido o valor de R$ 102.000,00 (cento e dois mil reais), a título de honorários de sucumbência.

O Código de Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil prevê, expressamente, em seu art. 38, ser possível a fixação de honorários contratuais em até 50% (cinquenta por cento) do valor auferido pela parte. Trata-se da modalidade quota litis, em que o advogado somente recebe se vencer a causa. Segue-se a transcrição do dispositivo citado:

Art. 38. Na hipótese da adoção de cláusula quota litis, os honorários devem ser necessariamente representados por pecúnia e, quando acrescidos dos de honorários da sucumbência, não podem ser superiores às vantagens advindas em favor do constituinte ou do cliente.

Em outras palavras, o advogado adere a um risco ao assumir a causa. Caso não seja vencedor, não receberá nada, sendo que, no mais das vezes, sequer os valores despendidos com despesas naturais que ocorrem no curso do processo (cópias, deslocamentos, ligações, manutenção do escritório etc.).

O argumento utilizado pelo Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que os honorários devem ser fixados com moderação, atendida a relevância, vulto e dificuldades da causa, tempo e trabalho necessários e a condição econômica do cliente, entre outros fatores, em nada auxilia a fundamentação, uma vez que tal altercação se presta para a fixação de honorários sucumbenciais, estes, impreterivelmente, do advogado que militou na causa, segundo as regras do art. 20 e parágrafos, do Código de Processo Civil.

O Código de Ética e Disciplina da OAB, ao permitir a contratação de honorários advocatícios na modalidade quota litis, seguiu, justamente, o que o Superior Tribunal de Justiça ponderou para rever os honorários: a razoabilidade. É razoável que ao advogado seja garantido um percentual mais elevado em se tratando de contratação baseada, unicamente, no risco? A indagação beira o óbvio. Claro que sim. Da mesma forma que o contrário se mostraria irrazoável: conferir honorários elevados, quando já existisse adiantamento de quantia na firmação do contrato ou no desenrolar da causa, o que não aconteceu no caso analisado. Com a devida vênia, a decisão do Superior Tribunal de Justiça feriu enormemente a autonomia da vontade das partes contratantes, pondo por terra a liberdade de contratar, inquietando a classe advocatícia com temores de insegurança jurídica. E o que é mais grave: aniquilou a autonomia do conselho de classe mais importante do Brasil – a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) –, o qual tem por escopo zelar pela fiscalização de seus profissionais, inclusive com procedimentos próprios, a exemplo do processo ético-disciplinar.