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Em “Vidas Secas”, romance regionalista da segunda fase modernista, Graciliano Ramos retrata, numa escrita que empresta emoção à obra, a peleja de uma família que luta incessantemente pela vida e, nas frequentes mudanças, intenta encontrar uma morada, talvez uma dignidade.
Como principal personagem, Fabiano, homem rude, típico vaqueiro do sertão nordestino, não é um sujeito letrado, comparando-se, por vezes, a um animal. Fabiano nunca se preocupou com o Brasil. Na verdade, o Brasil nunca deu conta de cuidar de Fabiano. Fabiano já é muito —talvez nada. Por isso ele não conta, não “numera”, não entra no cálculo.
Fabiano existe no Brasil. Ele não possui ideologia. Pouco lhe importa a direita, a esquerda, o liberalismo ou qualquer outra opinião. Ele é mais um, mas é mais um. É uma vida, um destino e uma sorte. À sorte, a vida lhe encaminhou.
Ele não tem razão; talvez até tenha. A razão lhe falta quando lhe vem a vida, que de nada lhe poupa.
Com graça e desejo, Fabiano quer viver. Talvez Graciliano lhe tenha dado muita voz —ousadia alagoana estampada em outro século, quiçá pensada.
Mas Fabiano também almeja, vivencia, convive; até mesmo porque vive. A ele, nossos esforços, com elogios, porquanto de valores a vida não lhe desproveu. Ele é o retrato do país —esforça-se, peleia, tateia a esperança e não fenece.
Por que tantos “Fabianos”? Sabe-se lá a ciência explicar. Ele só existe e ponto. E que mal tem em existir? Culpa dele? Creio não. Receio nosso, que não acudimos tão castigado sujeito. Mas ele sequer se caleja, quanto menos se lastima. Ele só se carrega, mas não é carga. É esperança, muito viva, inclusive.
Fabiano sonha. E que mal há em sonhar? Quem de nós pode recriminar um sonho? Quanta afobação!
E veja, pois, que Fabiano nem ambiciona levar um encargo a mais. Que Estado lhe dará dignidade? Quanta inquietação! É muito perguntar? Talvez não. A ele, nossos préstimos; a nós, reflexão. Fabiano não quer nosso espaço —muita ilusão de nossa parte pensar nisso. Ele só quer ser. É de “direito” querer ser, por que não?
Fabiano, te devemos muito. Dignidade? Certamente. Mais que isso? Por igual. Que te falta, irmão? Quase tudo.
Nesse trecho, eu me encerro. Sou pouco; todavia, sonho. Só sonho e almejo um mundo melhor. E você, Fabiano, me disse, bem baixinho, numa timidez resolvida, calada, campestre: eu quero ser — vou pertencer.
Meu desejo? Te incluir. Um dia estaremos juntos e, “emparelhados”, seremos mais —melhores, decerto.
A você, Fabiano, meu pretensioso “até logo”. Um dia me redimo e, comigo, vou tentar carregar um bocado de gente.