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QUANTO À POSSIBILIDADE DE DEMISSÃO POR JUSTA CAUSA DE EMPREGADOS USUÁRIOS DE DROGRAS
Faculdade ou dever do empregador?
“A liberdade de contratar e demitir – ainda que se prove o contrário –, quando se trata de iniciativa privada, é um dos sustentáculos do regime capitalista, nitidamente assim reconhecido – por pura opção do legislador constituinte originário – pela Carta de 88.”
Corriqueiras são as decisões dos Tribunais do Trabalho no país, incluindo o Tribunal Superior do Trabalho, quanto à possibilidade de demissão, por justa causa, de empregados que fazem uso de álcool, drogas e afins. O tema é polêmico, decerto! Há julgados em ambos os sentidos, ora permitindo a demissão por justa causa, ora entendendo tratar-se de ato arbitrário do empregador. A vetusta, anosa e quase secular legislação trabalhista prevê a possibilidade de o empregador demitir por justa causa “o empregado que apresente embriaguez habitual ou em serviço” (art. 482, f, da clT). alargou-se a interpretação literal do mencionado dispositivo legal para incluir, também, a utilização de drogas.
Durante muito tempo, essa foi a tônica da jurisprudência trabalhista – interpretação exata do dispositivo legal, desaguando, portanto, na justa causa. ocorre que, nada obstante a restrição do que dispõe a clT quanto ao tema, passou-se a conferir interpretações sistemáticas ao dispositivo, quando muito com arrimo na chamada função social da empresa e outros valores e princípios constitucionais.
Tirante toda essa dubiedade de anotações, o ponto que se procura destacar no presente ensaio não é a justeza de qualquer das interpretações que são conferidas. comunga-se, na total extremidade, de que os dependentes químicos devem ter tratamento adequado para a consequente recuperação. a discussão não é esta, contudo.
O que se pretende, em verdade, é conjecturar acerca de quem é o ônus dessa política de recuperação. dito de outro modo: é obrigação do empregador arcar com todo esse custo, que, de regra, deveria ser do estado? aqui o ponto essencial da discussão.
Não se cogita, segundo já ressaltado, sobre a grandeza do restabelecimento de um dependente químico – é essencial. Trata-se, sem dúvidas, de uma enfermidade – nitidamente assim reconhecida pela organização mundial de Saúde (cId 10F4) –, que deve e merece ser combatida. mas até que ponto esse ônus deve ser do empregador? eis aqui a grande polêmica.
Em recentíssimo julgado, o Tribunal Superior do Trabalho – TST entendeu pela necessidade de reintegração de empregado usuário de cocaína. a decisão proferida inicial- mente no processo foi reformada pelo Tribunal regional do Trabalho – TRT, que entendeu não ser encargo da empresa a reintegração do empregado. O TST, reformando o julgado do TRT, não só reconheceu a necessidade de reintegração, como também deferiu o pagamento de indenização por danos morais pela dispensa considerada injusta e ilegal.
A nosso sentir, andou mal o TST e desde já se explica. os empregadores brasileiros já arcam com custos astronômicos para manutenção dos contratos de trabalho (um dos mais elevados custos do mundo). Submetem-se a uma carga tributária mastodôntica, que, supostamente, somente existe para fazer valer a contraprestação estatal (inclusive com a realização de políticas públicas para a recuperação de drogados).
Não é, portanto, dever da empresa ter de suportar, afora excessivas despesas com a manutenção dos contratos de trabalho, perdas tangenciais que devem ser de suporte pelo estado. Tudo isso produz bitributação, duplicidade de paga- mento de verbas salariais, porquanto, por óbvio, um empregado com variações comportamentais decorrentes do uso de drogas não possui o mesmo per l que outro indiscutivelmente pronto para o desempenho de iguais atividades na empresa.
A liberdade de contratar e demitir – ainda que se prove o contrário –, quando se trata de iniciativa privada, é um dos sustentáculos do regime capitalista, nitidamente assim reconhecido – por pura opção do legislador constituinte originário – pela carta de 88. pensar de forma contrária é reformar a constituição, tarefa que não cabe ao Judiciário, haja vista lhe ser assegurada a interpretação, não a reforma.
NOTAS
1 a notícia encontra-se veiculada no sitio do Tribunal Superior do Trabalho em destaque do dia 23 de setembro de 2015.
2 o número do processo não se encontra disponível por questões de segredo de justiça.
GUILHERME CARVALHO E SOUSA é doutorando em direito administrativo pela pontifícia universidade católica de São paulo (puc-Sp), mestre em direito e políticas públicas pelo uNIceuB, especialista em direito público e especialista em direito do Trabalho e processual do Trabalho. advogado militante, com atuação prioritária nos tribunais superiores e na área de contratação pública e direito empresarial. Sócio do escritório guilherme carvalho & advogados associados. professor universitário em Brasília, palestrante e professor de pós-graduação em vários cursos, faculdades e tribunais de contas. autor de vários artigos e pareceres jurídicos publicados em revistas de grande circulação. ex-procurador do estado do amapá e Bacharel em administração de empresas.