CONTRATO ADMINISTRATIVO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS – REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO COM PEDIDO DE REAJUSTE DE PREÇOS – ALTERAÇÃO DO VALOR DO SALÁRIO MÍNIMO – FATO PREVISÍVEL DE CONSEQUÊNCIA INCALCULÁVEL – EQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO – REAJUSTE – IMPOSSIBILIDADE – REVISÃO CONTRATUAL POSSIBILIDADE (INTELIGÊNCIA DO ART. 65, II, D, DA LEI Nº 8.666/93)

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Primeiramente, cumpre salientar que a análise do presente caso tem por fim, só e somente só, o parecer jurídico expedido pela assessoria jurídica da entidade, haja vista que o Detran/AP é uma autarquia estadual. Tal tema já foi dema- siadamente debatido por este parecerista quan- do da emissão dos Pareceres nos 891/20111 e 1176/2011.

Explica-se: a supervisão, eminentemente ju- rídica, empreendida pela Procuradoria do Estado não carece da análise jurídica prévia da própria entidade. Dito de outro modo, há a necessidade de manifestação anterior do órgão jurídico da au- tarquia, forte na independência administrativa e funcional da qual é detentora, eis que integrante da Administração indireta.

Assim sendo, não existe, necessariamen- te, obrigatoriedade de haver controle de todo e qualquer ato da Administração indireta pela Ad- ministração central. O controle existe, nos limi- tes e hipóteses taxativamente previstos em lei (no caso da Procuradoria do Estado do Amapá, controle do ato do órgão jurídico da entidade da Administração indireta).

Tendo em vista que o presente processo veio instruído com manifestação jurídica do órgão ju- rídico da entidade (Detran/AP),2 faz-se possível a emissão de parecer por esta Procuradoria, na forma preconizada no § 1º do art. 2º da Lei Com- plementar nº 006/94.

 

  1. RELATÓRIO

Trata-se de pedido de reajuste de preços do contrato de prestação de serviços de Agentes de Portaria firmado entre a empresa interessada e o Departamento Estadual de Trânsito do Amapá (Detran/AP).

O Detran/AP firmou, em 4.6.11, com a em- presa interessada, contrato de prestação de ser- viços de Agentes de Portaria, com vigência pelo prazo de 12 (doze) meses a contar da data de sua assinatura. No aludido contrato não há cláu- sula prevendo reajuste de preços.

Sobreveio, com a edição da Lei nº 12.382/11, regulamentada pelo Dec. nº 7.655/11, novo valor de salário mínimo – R$ 622,00 (seiscentos e vin- te e dois reais), com acréscimo, em relação ao salário mínimo anterior – R$ 545,00 (quinhentos e quarenta e cinco reais), significante.

 

  1. SOUSA, Guilherme Carvalho e. Administração indireta. Supervisão. Princípio do controle. Possibilidade condiciona- da às hipóteses legais. Tutela eminentemente jurídica da análise jurídica do órgão jurídico da entidade (inteligência do art. 2º, caput, c/c § 1º da Lei Complementar estadual nº 006/94). Fórum de Contratação e Gestão Pública FCGP, Belo Horizonte, ano 10, n. 120, p. 81-84, dez. 2011. Parecer.
  2. Parecer jurídico nº 081/2012 – Detran.

 

O contrato fora consolidado com base no piso salarial da categoria – Agentes de Portaria –, no importe de R$ 605,01 (seiscentos e cinco reais e um centavo), obtido na Convenção Coletiva de Trabalho de 1º.5.11, com vigência até 30.4.13, firmada entre o Sindicato dos Trabalhadores em Asseio e Conservação do Estado do Amapá e o Sindicato das Empresas de Asseio e Conserva- ção do Estado do Amapá. Porém, com o novo va- lor do salário mínimo, regulamentado pelo Dec. nº 7.655/11, o salário profissional passou a ser inferior ao mínimo legal estabelecido no País.

A empresa reputou, portanto, que o incre- mento no valor do salário mínimo oneraria sua folha de pagamento e, para tanto, requereu rea- juste contratual, juntando, com seu pedido, plani- lha de custos de formação de preços (fls. 6-23).

O processo veio instruído com a já menciona- da Convenção Coletiva de Trabalho e respectivo requerimento de registro no Ministério do Traba- lho e Emprego, além do contrato convencionado entre o Detran/AP e a empresa requerente.

Às fls. 77, há despacho do Coordenador Administrativo-financeiro do Detran/AP, encami- nhado à Assessoria de Desenvolvimento Institu- cional, solicitando análise e manifestação quan- to à possibilidade de revisão do contrato. Esta, em despacho de 9 (nove) linhas, fls. 79, opinou pelo deferimento dos reajustes solicitados pela empresa.

O parecer jurídico do órgão jurídico da Se- cretaria, de fls. 83-88, opinou pelo deferimento do pedido de equilíbrio econômico-financeiro, com base no art. 65, II, d, da Lei nº 8.666/93.

Em síntese, eram os fatos que mereciam ser narrados.

Quesitos:

    • – O que é e como se define o equilíbrio eco- nômico-financeiro em um contrato administrativo?
    • – Qual a diferença existente entre revisão, repactuação e reajuste do contrato administrativo?
    • – O que se entende por fato imprevisível e fato previsível de efeitos incalculáveis?
    • – O incremento salarial decorrente do au- mento do salário mínimo pode ser considerado fato imprevisível?

Diante dos quesitos acima formulados, pas- sa-se a expender a opinião exarada no presen- te dictamen.

 

  1. FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
  1. Quanto à mutabilidade do contrato ad- ministrativo

A mutabilidade, inerente ao contrato admi- nistrativo, é regra que independe de anteceden- te previsão legal, na medida em que ocorrem fa- tores que, diversamente, podem comprometer a estabilidade contratual prevista no momento da firmação da avença. Dessa feita, a Administra- ção, utilizando-se da supremacia que o interes- se público tem sobre o interesse privado, impõe alterações unilaterais nos contratos, as quais são desatentas, em idêntica conformidade, aos inte- resses privados, tudo em consonância à variação cambiante inerente aos contratos administrativos.

Relembre-se, por igual modo, que os contra- tos administrativos também podem sofrer altera- ções por provocação do contratado, ou de comum acordo entre as partes – Poder Público e particu- lar –, sempre que ocorrentes fatores cuja previsi- bilidade, senão inexistente, é, ao menos, duvido- sa ou de efeitos incalculáveis. Há, por certo, a ne- cessidade de também se manter incólume o pac- to contratual firmado de início, ganhando reforço, quanto a este ponto, a chamada cláusula rebus sic stantibus e, por igual, a Teoria da Imprevisão.

Compete, para o presente debate, enaltecer as alterações contratuais pactuadas consensual- mente,3 em especial destacando como fatores alheios ao contrato podem comprometer o equi- líbrio econômico-financeiro da avença.

  1. O equilíbrio econômico-financeiro nos contratos administrativos

Antes da análise pontual do caso concre- to, faz-se necessário tecer algumas considera- ções sobre o equilíbrio econômico-financeiro

 

  1. Não se desborda do relevo que as alterações unilaterais empreendidas pela Administração ganham na doutrina e jurisprudência.

 

nos contratos. Longe da discussão atinente ao conceito,4 a Constituição Federal assegura o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos administrativos:

Art. 37. Omissis

XXI – ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante pro- cesso de licitação pública que assegure igual- dade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técni- ca e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações (destacou-se).

O equilíbrio econômico-financeiro dos con- tratos resguarda a manutenção do objeto pac- tuado, de modo a adaptar o contrato adminis- trativo a qualquer circunstância factual que nele possa interferir. O objetivo da norma constitucio- nal é afastar qualquer variação que intervenha nas condições contidas na proposta. Com efei- to, a regra é que, paralelamente ao direito de a Administração exigir a execução do contrato, ao contratado particular seja garantido o direito ao lucro, restringindo a potestade da Administração.

Marçal Justen Filho pontua que:

A tutela constitucional à equação econô- mico-financeira deriva de outros princípios constitucionais. Entre eles, estão os princí- pios da isonomia, da tutela e da indisponibi- lidade dos interesses fundamentais.5

Celso Antônio Bandeira de Mello, manifes- tando-se sobre equilíbrio econômico-financeiro, esclarece:

Equilíbrio econômico-financeiro (ou equa- ção econômico-financeira) é a relação de

igualdade formada, de um lado, pelas obriga- ções assumidas pelo contratante no momento do ajuste e, de outro lado, pela compensação econômica que lhe corresponderá.6

Nessa linha, a equação financeira deve ser conservada durante toda a execução do contrato, afastando fatores exógenos que comprometam a retribuição devida pela Administração ao parti- cular contratado. Assim sendo, qualquer quebra do equilíbrio contratual deverá ser restabelecida para que não haja prejuízos nem ao particular, quanto menos à Administração Pública, que tem a obrigação de efetuar o pagamento no patamar justo que foi fixado no início do contrato.

  1. As diversas modalidades para se che- gar ao equilíbrio econômico-financeiro

Como já mencionado, a equação econômico-

-financeira de uma avença é corolário do princí- pio da igualdade. É o restabelecimento de um status anterior quebrado por algum fator cuja previsibilidade era desconhecida ou, ainda que conhecida, de difícil mensuração, ou mesmo por fatores conhecidos, pontualmente previsíveis, a exemplo da correção monetária e da inflação. Logo, existem fatores que podem atingir o equi- líbrio de qualquer contrato, carecendo-se, assim, de mecanismos de manutenção da igualdade contratual. O ordenamento nacional dispõe, por- tanto, de três instrumentos de manutenção do equilíbrio econômico-financeiro: reajuste, revisão e repactuação.7

O primeiro deles – reajuste – está ligado a uma situação de previsibilidade estampada, atrelada a uma variação de preço previsível, calculada, mantendo-se a inalterabilidade do contrato por meio de mecanismos previstos no próprio instrumento convocatório e no contra- to, utilizando-se, no mais das vezes, de índices oficiais. Consiste, basicamente, em atualização monetária.

 

  1. A doutrina diverge sobre a conceituação. Sobre o tema, Celso Antônio Bandeira de Mello, in Curso de direito admi- nistrativo. 22 ed. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 599-600, conceitua contrato administrativo da seguinte forma: “é um tipo de avença travada entre a Administração e terceiros na qual, por força de lei, de cláusulas pactuadas ou do tipo de objeto, a permanência do vínculo e as condições preestabelecidas assujeitam-se a cambiáveis imposições de inte- resse público, ressalvados os interesses patrimoniais do contratante privado”.
  2. JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 12 ed. São Paulo: Dialética, 2008. p. 717.
  3. BANDEIRA DE MELLO, op. cit., p. 619.
  4. Sobre o tema: OLIVEIRA, Ricardo Alexandre Pinheiro de. O equilíbrio econômico-financeiro lato sensu dos contratos administrativos e as suas múltiplas espécies. Revista Zênite Informativo de Licitações e Contratos (ILC), Curitiba: Zênite, n. 216, p. 125-137. fev. 2012.

 

O reajuste de preços pode ser conceitua- do como a alteração do valor do contrato, por meio de aplicação de índices previamente es- tabelecidos no ato convocatório da licitação e no respectivo ajuste, ou posteriormente eleito por acordo entre as partes, com observância de periodicidade mínima de um ano.

Na verdade, o reajuste teria por finali- dade permitir expressamente a atualização dos valores fixados, a fim de manter o valor do contrato no mesmo patamar inicialmente avençado, sendo que apenas será devido nos termos expressamente previstos no ato con- vocatório da licitação e no respectivo ajuste celebrado 8  (grifou-se).

A previsão de reajuste encontra-se contida no art. 40, XI, da Lei nº 8.666/93, com a redação da Lei nº 8.883/94.

Art. 40. O edital conterá no preâmbulo o número de ordem em série anual, o nome da repartição interessada e de seu setor, a mo- dalidade, o regime de execução e o tipo da licitação, a menção de que será regida por esta Lei, o local, dia e hora para recebimen- to da documentação e proposta, bem como para início da abertura dos envelopes, e in- dicará, obrigatoriamente, o seguinte:

………………………………………………………..

XI – critério de reajuste, que deverá re- tratar a variação efetiva do custo de produ- ção, admitida a adoção de índices específi- cos ou setoriais, desde a data prevista para apresentação da proposta, ou do orçamento a que essa proposta se referir, até a data do adimplemento de cada parcela.

O que, em suma, caracteriza o reajuste é a ausência de imprevisão. Em se tratando de fato

imprevisível, a figura do reajuste perde sua na- tureza, em especial diante da obviedade de não se prever em instrumento contratual, nem mes- mo editalício, fatos cuja ocorrência é incerta ou, ainda que certa, de efeitos duvidosos ou impre- visíveis.9 Nesse sentido:

O reajuste, por sua vez, tem lugar em decorrência da instabilidade econômica e da consequente variação dos preços dos bens, serviços ou salários, onerando demasiada- mente a parte que dependia da aquisição dos produtos majorados em seu valor. Como mencionada flutuação econômica é rotinei- ra, ordinária, tida até mesmo como normal, a mesma é por demais previsível quando da celebração de qualquer contrato, administra- tivo ou não. Assim, tendo em vista a previsi- bilidade da inflação e da elevação dos bens, serviços e salários, não se aplica, in casu, a teoria da imprevisão, uma vez que esta diz respeito a fatos imprevisíveis, e, portanto, não previstos no contrato.10

Há que se notar que o reajuste está condi- cionado à existência de dois fatores: (i) previsão no instrumento convocatório e no contrato e (ii) obediência ao prazo mínimo de um ano, sem os quais o instituto é desnaturado.11

O Superior Tribunal de Justiça não destoa de tal posicionamento:

Processual Civil e Administrativo. Contra- to administrativo. Reajuste de preços. Ausên- cia de autorização contratual. Descabimen- to. 1. O reajuste do contrato administrativo é conduta autorizada por lei e convencionada entre as partes contratantes que tem por es- copo manter o equilíbrio financeiro do con- trato. 2. Ausente previsão contratual, resta

 

  1. OLIVEIRA FILHO, Gilberto Bernardino de. Repactuação, revisão e reajuste. Boletim de Licitações e Contratos BLC, n. 2, 2007. p. 129.
  2. “O reajuste é o instrumento que se presta a manter o equilíbrio econômico-financeiro do contrato em face da variação de preço previsível, normal, lenta, paulatina, que, de certa maneira, decorre do fenômeno inflacionário”. NIEBUHR, Joel de Menezes. Licitação pública e contrato administrativo. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2011. p. 884.
  3. ARAÚJO, Kleber Martins de. Contratação pública – Edital – Contrato – Reajuste – Revisão – Reequilíbrio econômico-

-financeiro. Revista Zênite de Licitações e Contratos ILC, Curitiba: Zênite, n. 110, p. 301, abr. 2003.

  1. “Então, o reajuste deve ser obrigatoriamente disciplinado pelo edital de licitação pública. Pode-se afirmar, por con- sequência, que se o edital não dispõe sobre o critério de reajuste, ele contraria a lei e, por óbvio, é ilegal”. Mesmo as- sim, o autor pondera que “é devido o reajuste independentemente da previsão no edital ou no contrato”. NIEBUHR, Joel de Menezes, op. cit., p. 885-886.

 

inviabilizado o pretendido reajustamento do contrato administrativo. 3. Recurso espe- cial conhecido em parte e, nessa parte, não provido.12

Quanto à periodicidade mínima, precisas as lições de Joel Niebuhr:

Em vista disso, afirma-se que o reajuste de preços está condicionado à periodicidade mínima. Cumpre advertir que o período míni- mo de doze meses, ao fim do qual é devido o reajuste, não é contado da assinatura do contrato, como equivocadamente muitos su- põem. O § 1º do art. 3º da Lei nº 10.192/01 prescreve com clareza que os doze meses contam-se da data da apresentação da pro- posta ou do orçamento a que esta se refere.13

Diverso é o instituto da repactuação, o qual se refere a serviços contínuos, no âmbito da Ad- ministração Pública federal, sendo, assim, regu- lado por meio de decreto federal, não obrigató- rio para os demais entes federativos, porém por eles podendo ser utilizado dentro de sua com- petência legislativa. Na verdade, a repactuação é “o instrumento para manter o equilíbrio econô- mico-financeiro dos contratos de prestação de serviços contínuos firmados pela Administração Pública Federal”.14

A repactuação – para muitos, um modo de reajuste e, por vezes, de revisão – foi prevista pelo Dec. federal nº 2.271/97, tendo em vista a contratação de serviços contínuos no âmbito da Administração federal direta e autárquica. A con- ceituação vem exposta no art. 5º:

Art. 5º Os contratos de que trata este De- creto, que tenham por objeto a prestação de serviços executados de forma contínua po- derão, desde que previsto no edital, admitir repactuação visando a adequação aos novos preços de mercado, observados o interregno mínimo de um ano e a demonstração analíti- ca da variação dos componentes dos custos do contrato, devidamente justificada.

Parágrafo único. Efetuada a repactuação, o órgão ou entidade divulgará, imediatamen- te, por intermédio do Sistema Integrado de Administração de Serviços Gerais, os novos valores e a variação ocorrida.

De igual modo ao reajuste e à revisão (adian- te tratada), a repactuação visa à manutenção do equilíbrio econômico-financeiro do contrato. Complementando o disposto no Dec. federal nº 2.271/97, o Ministério do Planejamento, Orça- mento e Gestão editou a Instrução Normativa nº 2/08, cujo art. 37 admite a repactuação dos preços dos serviços continuados contratados desde que seja observado o interregno mínimo de um ano das datas dos orçamentos aos quais a proposta se referir. Explicitando como se conta tal prazo, o art. 38 da mesma instrução norma- tiva prevê:

Art. 38. O interregno mínimo de 1 (um) ano para a primeira repactuação será con- tado a partir:

  1. – da data limite para a apresentação das propostas constante do instrumento convo- catório, em relação aos custos com a execu- ção do serviço decorrentes do mercado, tais como o custo de materiais e equipamentos necessários à execução do serviço; ou
  2. – da data do acordo, convenção ou dis- sídio coletivo de trabalho ou equivalente, vi- gente à época da apresentação da proposta, quando a variação dos custos for decorrente da mão-de-obra e estiver vinculada às datas-

-base destes instrumentos.

Saliente-se que a figura da repactuação não é prevista na Lei nº 8.666/93, mas apenas em decreto federal. Há fortes semelhanças entre tal instituto e o reajuste,15 de modo que se fazem necessários 2 (dois) requisitos: (i) interregno mínimo de tempo e (ii) previsão no instrumento convocatório. Todavia, ao contrário do reajuste, a repactuação não pode ser realizada por meio do estabelecimento prévio de índices gerais ou setoriais, sendo necessária a sua apuração por meio da variação efetiva do custo de produção.

 

  1. REsp. nº 730.568/SP, 2ª T., rel. Eliana Calmon, julg. 6.9.07. 13.  NIEBUHR, 2011, p. 889.
  1. Idem, ibidem, p. 884.
  2. Textualmente, o caput do art. 37 da IN nº 2/08 do MPOG categoriza a repactuação como forma de reajuste.

 

Por fim, a figura da revisão contratual, a qual, ao contrário do reajuste e da repactuação, trata de fatos imprevisíveis, ou previsíveis, porém, de consequências incalculáveis, encontrando abrigo no art. 65, II, d, da Lei nº 8.666/93, verbis:

Art. 65. Os contratos administrativos regi- dos por esta Lei poderão ser alterados, com as devidas justificativas, nos seguintes casos:

………………………………………………………

II – por acordo das partes:

………………………………………………………..

d) para restabelecer a relação que as partes pactuaram inicialmente entre encar- gos do contratado e a retribuição da Admi- nistração para a justa remuneração da obra, serviço ou fornecimento, objetivando a ma- nutenção do equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato, na hipótese de sobrevirem fatos imprevisíveis, ou previsíveis, porém de conseqüências incalculáveis, retardadores ou impeditivos da execução do ajustado, ou, ainda, em caso de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe, configurando álea econô- mica extraordinária e extracontratual.

Diferentemente do que ocorre com o reajuste e a repactuação, a revisão não carece de previ- são editalícia, até mesmo porque oriunda de um fato imprevisível, não havendo como se compor, no instrumento convocatório, a sua previsão.Visa, na verdade, evitar o enriquecimento sem causa de qualquer das partes contratantes, podendo ocorrer a qualquer tempo, desde que existentes fatores imprevisíveis, ou previsíveis, todavia de consequências incalculáveis.

  1. A análise do caso em concreto

Mais uma vez, não é demais mencionar que a análise empreendida neste parecer cinge-se, exclusivamente, à opinião exarada pelo órgão jurídico da entidade. Ao contrário do que ocorre com a Administração direta, esta Procuradoria não detém atribuição para avaliar todos os atos encartados neste processo administrativo posto sob crivo, uma vez que o ordenamento jurídico estadual assim não permite. Compulsando os au- tos, percebe-se que o parecer jurídico da Asses- soria Jurídica do Detran/AP entendeu pelo defe- rimento do pleito da empresa requerente.

O contrato não prevê a cláusula de reajuste, e ainda que previsse, não poder-se-ia utilizar tal instrumento de reequilíbrio, haja vista a inexis- tência de prazo mínimo de 1 (um) ano, a contar da apresentação da proposta ou do orçamento a que esta se refere.

Assim sendo, totalmente inaplicável, ao pre- sente caso, o instituto do reajuste. Caberia, por outro lado, aplicar a repactuação? A resposta é, de igual modo, simplória: não, eis que inexisten- tes os requisitos para sua aplicação.

Resta, por fim, analisar o instituto da revisão contratual. Como já salientado, a revisão contra- tual exige, necessariamente, a existência de fatos imprevisíveis ou previsíveis, mas de efeitos incal- culáveis. Esta é, claramente, a literalidade do art. 65, II, d, da Lei nº 8.666/93. Perceba-se, acima de tudo, que todo o parecer jurídico do órgão jurídico da entidade foi embasado neste dispositivo legal.

Indaga-se: o que é um fato imprevisível? O que é um fato previsível de consequência incal- culável? O incremento salarial decorrente do aumento do salário mínimo pode ser visto com nuances de imprevisibilidade? A jurisprudência, quanto a esta específica indagação (incremento salarial decorrente do aumento do salário míni- mo), é vaga e vazia, muito embora não seja si- lente quando o tema é o incremento salarial de- corrente de dissídio coletivo, o que não é o caso dos autos, veja-se:

Administrativo. Agravo regimental. Con- trato administrativo. Dissídio coletivo que pro- voca aumento salarial. Revisão contratual. Equilíbrio econômico-financeiro. Fato previsí- vel. Não incidência do art. 65, inc. II, alínea d, da Lei 8.666/93. Álea econômica que não se descaracteriza pela retroatividade.

    • É pacífico o entendimento desta Corte Superior no sentido de que eventual aumen- to de salário proveniente de dissídio coletivo não autoriza a revisão do contrato adminis- trativo para fins de reequilíbrio econômico-

-financeiro, uma vez que não se trata de fato imprevisível – o que afasta, portanto, a inci- dência do art. 65, inc. II, d, da Lei nº 8.666/93. Precedentes.

 

    • A retroatividade do dissídio coletivo em relação aos contratos administrativos não o descaracteriza como pura e simples álea econômica.
    • Agravo regimental não provido.16

O aumento salarial a que está obrigada a contratada por força de dissídio coletivo não é fato imprevisível capaz de autorizar a revi- são contratual de que trata o art. 65 da Lei nº 8.666/93.17

Em relação a revisão e dissídio coletivo, o entendimento dominante do STJ é no sen- tido de que o aumento salarial a que está obrigada a contratada, em decorrência de dissídio coletivo, não caracteriza fato impre- visível, não autorizando a revisão dos crité- rios contratuais ajustados no momento da celebração do contrato.18

Vários outros Tribunais, além das decisões do Superior Tribunal de Justiça, acima mencionadas, seguem o mesmo posicionamento, a exemplo do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios e de vários Tribunais Regionais Federais.

Constitui fato previsível a ocorrência de dissídio coletivo que autoriza aumento do piso salarial da categoria profissional que execu- ta os serviços contratados do particular pela Administração, não se podendo falar do rom- pimento do equilíbrio econômico-financeiro do contrato, a ensejar revisão de sua remu- neração.19

Administrativo. Contrato administrativo. Reajuste salarial. Em decorrência de dissídio coletivo. Fato previsível. Inaplicabilidade da Teoria da imprevisão. I – Apelação cível inter- posta pela União Federal visando à reforma da r. sentença (fls. 146/155) que julgou proce- dente em parte o pedido autoral, para conde- nar a União a pagar as diferenças resultantes da revisão do contrato firmado com a autora, a partir do primeiro mês de sua execução,

segundo o impacto representado nos custos constantes da sua proposta, referentes aos valores dos salários dos seus empregados e dos respectivos encargos sociais e previ- denciários, como apurado em liquidação por arbitramento – perícia contábil. II – O aumen- to salarial dos empregados da contratada em decorrência de dissídio coletivo previamente conhecido é fato plenamente previsível que não autoriza a revisão contratual prevista no art. 65, II, d, da Lei nº 8.666/93. Precedentes do eg. Superior Tribunal de Justiça. III – Pro- vimento do apelo e da remessa.20

Administrativo. Serviço de vigilância. Con- trato administrativo. Convenção coletiva de tra- balho da categoria. Reajuste salarial. Equilí- brio econômico-financeiro. Art. 65, II, d, da Lei 8.666/93. Inaplicação. Apelação improvida.

1. O aumento salarial de categoria, de- corrente de convenção coletiva de trabalho é previsível e não faz parte do rol de requisitos legais que possibilitam alteração contratual com o fim de manter equilíbrio econômico-

-financeiro do contrato.

2. O art. 65, II, d, da Lei nº 8.666/93 é inaplicável à hipótese.21

À luz dos julgados acima transcritos, perce- be-se, veementemente, que o aumento de salá- rios decorrente de dissídio coletivo não oportuni- za revisão contratual, haja vista tratar-se de fato previsível. Entretanto, a questão aqui debatida é outra: aumento salarial por força do aumento do salário mínimo.

Houve aumento expressivo no valor do salá- rio mínimo, chegando, inclusive, a ultrapassar o piso salarial da categoria. A Constituição Federal de 1988 estabelece, entre os direitos dos traba- lhadores, a garantia de salário nunca inferior ao mínimo.22 Dessa feita, é evidente que a empresa interessada não poderá manter o salário de seus funcionários (Agentes de Portaria) inferior ao mí- nimo legal, por expressa vedação constitucional.

 

  1. STJ, AgR no REsp. nº 957.999, 2ª T., rel. Min. Mauro Campbell Marques, j. em 22.6.10.
  2. STJ, REsp. nº 411.101, rel. Min. Eliana Calmon, DJ de 8.9.03.
  3. STJ, AgREsp. nº 239.964, rel. Min. Francisco Falcão, DJ de 16.11.04. 19. TJ/DF, Apelação nº 46.156/97, j. em 20.4.1998.
  1. TRF2. ApCv nº 1996.51.01.000206-0, 5ª T. especializada, rel. Castro Aguiar, j. em 18.8.10.
  2. TRF5. AC nº 452.423, 3ª T., rel. Maximiliano Cavalcanti, j. em 2.7.09.

22. Art. 7º, VII, CF/88.

 

Quando da realização da licitação e con- sequente firmação do contrato administrativo, a proposta da empresa fora formalizada com base em salário profissional, à época, maior que o mínimo legal; porém, atualmente, este salário profissional encontra-se inferior ao próprio salá- rio mínimo, garantindo-se, assim, à empresa, o direito de revisar o contrato firmado, mantendo-

-se o equilíbrio econômico-financeiro do contra- to, evitando, por conseguinte, o enriquecimento injusto do Poder Público. Esta é, sem dúvida, a finalidade do instituto, o qual encontra, também, abrigo constitucional.

Poder-se-ia questionar sobre a previsibilida- de do aumento do salário mínimo. Por certo, a Lei nº 11.382 dispôs sobre o valor do salário mínimo em 2011 e sua política de valorização de longo prazo. No entanto, o valor efetivo do incremento salarial somente veio a ser efetivado por meio do Dec. nº 7.655/11, de 23.12.11, que regulamen- tou, nos termos do art. 3º da Lei nº 12.382/11, o valor do salário mínimo a partir de 1º.1.12. As- sim sendo, trata-se, sem dúvida, de um fato pre- visível, mas de efeitos incalculáveis, permitindo a revisão contratual.

 

  1. CONCLUSÃO
    • Algumas considerações

Ao lume do exposto, analisando o parecer jurídico do órgão jurídico da entidade – Parecer nº 081/2012 – Projur –, avalia-se a utilização do termo correto para a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro do contrato administrativo sob apreço: revisão contratual, prevista no art. 65, II, d, da Lei nº 8.666/93.

Em que pese haver entendimento favorável deste parecerista quanto à concessão do pleito da empresa, alguns requisitos fogem à alçada deste Procurador e da própria Procuradoria do Estado, concernentemente à atestação se os va- lores pleiteados na recomposição estão corretos. É que, como já dito, a manifestação deste órgão é sobre o parecer jurídico do órgão jurídico da au- tarquia, e não sobre todo o processo, mantendo-

-se, dessa feita, incólume a autonomia funcional da qual é detentora.

Logo, cumpre ao setor competente do De- tran/AP avaliar se os valores constantes nas pla- nilhas de custos e formação de preços juntados pela empresa interessada estão corretos, ob- servando se o requerimento cinge-se, apenas, ao valor do incremento do salário mínimo, bem assim sobre quais custos tal aumento estenderá seus efeitos.

    • A síntese possível e necessária

Diante do exposto, em consonância com os fatos e fundamentos jurídicos acima expendidos, e em atenção à manifestação da assessoria ju- rídica da entidade, opina-se pelo deferimento do pleito da empresa interessada.

Com escusas de haver excedido o limite meramente técnico que a consulta formulava e, adentrando, um pouco, na seara administrativa, é o que nos parece.

Remeto às considerações superiores. Macapá, 20 de abril de 2012.